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Com o dedo escrevia no chão- Artigo Semanal

COM O DEDO, ESCREVIA NO CHÃO

 

Neste Domingo a Liturgia da Palavra, que tem ao centro o Evangelho, nos traz uma das cenas mais bonitas da atividade de Jesus. Para mim não é apenas um detalhe. Aliás, para o Evangelista João, nada é mero detalhe, e tudo requer um olhar de profundidade, afinal este é o Evangelista representado pela figura da águia.

Quando Jesus estava no templo, e a multidão o acercou para ouvir o seu ensinamento, há uma ruptura de cena com a abrupta apresentação de uma mulher flagrada em adultério para que Jesus confirmasse a sentença já prevista na Lei de Moisés. Ou talvez não. A posição de Jesus em relação à mulher adultera entra em choque com os “oficiais da justiça” que se apoiam na Lei. A tomada de posição de Jesus, antes mesmo de mandar atirar a primeira pedra aqueles que se julgam sem pecado, é expressa através de um gesto aparentemente secundário: Ele, com o dedo, como escrevia no chão, se Ele estava no templo? Alguém já se interrogou sobre o que Jesus podia estar escrevendo, e porque, no chão?

Segundo o livro do Êxodo (31,18) Deus fala com Moisés no Sinal, e quando termina de falar, lhe entrega duas tábuas de pedra contendo a Lei escrita com o dedo. Para os judeus, portanto, a Lei é escrita com o dedo de Deus. Portanto, assim como a Torá é a Lei escrita pelo dedo de Deus, Jesus agora escreve uma nova Lei, ou o modo correto de praticar a Lei de Deus. Se a Lei de Moisés, mesmo escrita pelo dedo de Deus, era sobre pedras, e portanto restrita ao povo de Israel; a nova, que Jesus escreve no chão é a Lei universal e critério de decisão pessoal para a humanidade inteira.

O que Jesus escreveu não dá para deduzir, senão a partir das consequências. Os acusadores não resistem na sua justiça condenadora: “E eles, ouvindo o que Jesus falou, foram saindo um a um, a começar pelos mais velhos”. Também diante do que Jesus escreveu no chão a pecadora não resiste no seu pecado. Ela é perdoada e intimada à conversão: “Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora em diante não peques mais”.

Nossa compreensão da vida e até mesmo da religião criou uma terrível divisão entre justiça e misericórdia; entre Lei e liberdade. Agora temos a chance de aproveitar as inspirações do Ano Santo da Misericórdia para fazermos também esta reflexão e esta experiência. A nova Lei de Jesus é a misericórdia, escrita no chão do coração.

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Pe. Eronildo Oliveira
Vigário geral da Diocese de Quixadá, Coordenador de Pastoral da Diocese e Pároco da Paróquia Jesus,Maria e José.